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quarta-feira, 27 de outubro de 2010

ZOOLÓGICO DO PASSADO*

Historicamente, a relação dos seres humanos e os animais se formou e perdurou sob um paradigma antropocêntrico, no qual o primeiro é visto como figura central e elemento superior na natureza, ao passo que o valor dos animais decorre de sua utilidade para o Homem.

Na religião encontramos ensinamentos de que Deus criou o homem à sua semelhança, e os animais para servi-lo; aprendemos, desde pequenos, em casa e na escola, que o valor dos animais decorre de sua utilidade para os seres humanos.

Todavia, a evolução do conhecimento modificou totalmente esses dogmas.

Desde Darwin se constatou que as espécies não foram criadas separadamente, mas sim que evoluíram umas das outras.

Todos os animais são primos, mais próximos ou mais distantes, originários de um único e remoto ancestral; as diferenças entre eles não são de essência, e todos compartilham grande parte de seus genes.

Além disso, os animais não-humanos foram consagrados como seres senscientes, ou seja, capazes de terem sensações e emoções como alegria, tristeza e dor; capazes de se projetar no futuro e de ter apego a outros membros de sua espécie e mesmo a de outra espécie.

A partir disso, começa a ser construída e difundida a visão biocêntrica da natureza, em que a vida de cada ser tem importância intrínseca, por si só, embora também o tenha pela sua participação no ecossistema.

A legislação dos países passa a se desenvolver para captar essa mudança de paradigma, estabelecendo normas contra práticas de maus tratos contra animais.

Enfim, hoje, no Brasil e no resto do mundo, não se pode mais abordar o problema das relações dos homens com os outros animais com base em parâmetros já superados sob o ponto de vista científico e até mesmo jurídico.

É de se reconhecer, lamentavelmente, que os parâmetros estão mudando mais rápido do que as práticas.

A título de exemplo, veja-se a pretendida “importação” de girafas pelo Zoológico de Sapucaia, que mais adequadamente poderia ser chamada de seqüestro, por significar a subtração desses seres vivos de seu hábitat e da possibilidade de exercerem seu comportamento natural.

E isso para serem expostos em um cárcere a milhares de quilômetro de suas casas, expostos como objeto de diversão aos olhares curiosos de crianças que receberão, subliminarmente, uma idéia ultrapassada de que os interesses dos animais não são dignos de verdadeiro respeito.

Não há dúvida que uma interpretação minimamente biocêntrica da Lei dos Crimes Ambientais enquadraria tal conduta em ato de abuso contra animais.

Concluindo, todos os zoológicos do país fariam um papel muito mais consentâneo com a educação ecológica que aos poucos se difunde pelo planeta se usados apenas como abrigo de animais que necessitassem de reabilitação ou que não pudessem mais ser reintegrados em seu meio natural.

Mas ao servirem de palco ao exercício de atos de abuso e de desrespeito para com as outras espécies, acabam prestando um desserviço ao desenvolvimento ético da sociedade.

*Jaime Nudilemen Chatkin, Promotor de Justiça.

Um comentário:

  1. A justiça brasileira seria outra se a mínima parte dos seus agentes fossem portadores de um senso de visão tão secularista e anti-especista.

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